REZANDO COM O EVANGELHO DO DIA
(LECTIO DIVINA)
Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm
Quinta-feira da 2ª Semana da Quaresma
1) Oração
Ó Deus, que amais e
restaurais a inocência,
orientai para vós os corações
dos vossos filhos,
para que, renovados pelo
vosso Espírito,
sejamos firmes na fé e
eficientes nas obras.
Por nosso Senhor Jesus
Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.
2) Leitura do Evangelho (Lucas 16,
19-31)
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo,
segundo Lucas - Naquele tempo, 19Havia um homem rico que se vestia de púrpura e linho finíssimo, e que
todos os dias se banqueteava e se regalava. 20Havia também um
mendigo, por nome Lázaro, todo coberto de chagas, que estava deitado à porta do
rico. 21Ele avidamente desejava matar a fome com as migalhas que
caíam da mesa do rico... Até os cães iam lamber-lhe as chagas. 22Ora,
aconteceu morrer o mendigo e ser levado pelos anjos ao seio de Abraão. Morreu
também o rico e foi sepultado. 23E estando ele nos tormentos do
inferno, levantou os olhos e viu, ao longe, Abraão e Lázaro no seu seio. 24Gritou,
então: - Pai Abraão, compadece-te de mim e manda Lázaro que molhe em água a
ponta de seu dedo, a fim de me refrescar a língua, pois sou cruelmente
atormentado nestas chamas. 25Abraão, porém, replicou: - Filho,
lembra-te de que recebeste teus bens em vida, mas Lázaro, males; por isso ele
agora aqui é consolado, mas tu estás em tormento. 26Além de tudo, há
entre nós e vós um grande abismo, de maneira que, os que querem passar daqui
para vós, não o podem, nem os de lá passar para cá. 27O rico disse:
- Rogo-te então, pai, que mandes Lázaro à casa de meu pai, pois tenho cinco
irmãos, 28para lhes testemunhar, que não aconteça virem também eles
parar neste lugar de tormentos. 29Abraão respondeu: - Eles lá têm
Moisés e os profetas; ouçam-nos! 30O rico replicou: - Não, pai
Abraão; mas se for a eles algum dos mortos, arrepender-se-ão. 31Abraão
respondeu-lhe: - Se não ouvirem a Moisés e aos profetas, tampouco se deixarão
convencer, ainda que ressuscite algum dos mortos. - Palavra da salvação.
3) Reflexão
* Muitas vezes quando Jesus tinha uma coisa importante para comunicar, ele criava uma história ou contava uma
parábola. Assim, através da reflexão sobre a realidade visível, ele levava os
ouvintes a descobrirem os apelos invisíveis de Deus, presentes na vida. Uma
parábola é feita para fazer pensar e refletir. Por isso, é importante prestar
atenção até nos seus mínimos detalhes. Na parábola do evangelho de hoje
aparecem três pessoas: o pobre Lázaro, o rico sem nome e o pai Abraão. Dentro
da parábola, Abraão representa o pensamento de Deus. O rico sem nome representa
a ideologia dominante da época. Lázaro representa o grito calado dos pobres do
tempo de Jesus e de todos os tempos.
* Lucas 16,19-21: A situação do
rico e do pobre. Os dois
extremos da sociedade. De um lado, a riqueza agressiva. Do outro, o pobre sem
recurso, sem direitos, coberto de úlceras, impuro, sem ninguém que o acolhe, a
não ser os cachorros que lambem suas feridas. O que separa os dois é a porta
fechada da casa do rico. Da parte do rico não há acolhimento nem piedade pelo
problema do pobre à sua porta. Mas o pobre tem nome e o rico não tem. Ou seja,
o pobre tem o seu nome inscrito no livro da vida, o rico não. O pobre se chama
Lázaro. Significa Deus ajuda. É
através do pobre que Deus ajuda o
rico e que o rico poderá ter o seu nome no livro da vida. Mas o rico não aceita
ser ajudado pelo pobre, pois mantém a porta fechada. Este início da parábola
que descreve a situação, é um espelho fiel do que estava acontecendo no tempo
de Jesus e no tempo de Lucas. É espelho do que acontece até hoje no mundo!
* Lucas 16,22: A mudança que
revela a verdade escondida. O
pobre morreu e foi levado pelos anjos ao seio de Abraão. Morreu também o rico e
foi sepultado. Na parábola, o pobre morre antes do rico. Isto é um aviso aos
ricos. Enquanto o pobre está vivo à porta, ainda tem salvação para o rico. Mas
depois que o pobre morre, morre também o único instrumento de salvação para o
rico. Agora, o pobre está no seio de Abraão. O seio de Abraão é a fonte de vida, de onde nasceu o povo de Deus.
Lázaro, o pobre, faz parte do povo de Abraão, do qual era excluído enquanto
estava à porta do rico. O rico que pensa ser filho de Abraão não vai para o
seio de Abraão! Aqui termina a introdução da parábola. Agora começa a revelação
do seu sentido, através de três conversas entre o rico e o pai Abraão.
* Lucas 16,23-26: A primeira
conversa. Na parábola, Jesus
abre uma janela sobre o outro lado da vida, o lado de Deus. Não se trata do
céu. Trata-se do lado verdadeiro da vida que só a fé enxerga e que o rico sem
fé não percebia. É só à luz da morte que a ideologia do império se desintegra
na cabeça do rico e que aparece para ele o que é valor real na vida. No lado de
Deus, sem a propaganda enganadora a ideologia, os papéis são trocados. O rico
vê Lázaro no seio de Abraão e pede para ele vir aliviá-lo no sofrimento. O rico
descobre que Lázaro é o seu único benfeitor possível. Mas agora é tarde demais!
O rico sem nome é piedoso, pois reconhece Abraão e o chama de Pai. Abraão responde e o chama de filho.
Esta palavra de Abraão, na realidade, está sendo dirigida a todos os ricos
vivos. Enquanto vivos, eles ainda têm chance de se tornarem filhos e filhas de
Abraão, se souberem abrir a porta para Lázaro, o pobre, o único que em nome de
Deus pode ajudá-los. A salvação para o rico não é Lázaro trazer uma gota de
água para refrescar-lhe a língua, mas é ele, o próprio rico, abrir a porta
fechada para o pobre e, assim, transpor o grande abismo.
* Lucas 16,27-29: A segunda
conversa. O rico insiste:
"Pai, eu te suplico: manda Lázaro para a casa do meu pai. Tenho cinco
irmãos!" O rico não quer que seus irmãos venham no mesmo lugar de
tormento. Lázaro, o pobre, é o único verdadeiro intermediário entre Deus e os
ricos. É o único, porque é só aos pobres que os ricos podem e devem devolver o
que roubaram e, assim, restabelecer a justiça prejudicada! O rico está
preocupado com os irmãos. Nunca esteve preocupado com os pobres! A resposta de
Abraão é clara: "Eles têm Moisés e os Profetas: que os ouçam!" Têm a
Bíblia! O rico tinha a Bíblia. Conhecia-a até de memória. Mas nunca se deu
conta de que a Bíblia tivesse algo a ver com os pobres. A chave para o rico
poder entender a Bíblia é o pobre sentado à sua porta!
* Lucas 16,30-31: A terceira
conversa. "Não, pai, se
alguém entre os mortos der um aviso, eles vão se arrepender!" O próprio
rico reconhece que ele está errado, pois fala em arrependimento, coisa que durante a vida nunca sentiu. Ele quer um
milagre, uma ressurreição! Mas este tipo de ressurreição não existe. A única
ressurreição é a de Jesus. Jesus ressuscitado vem até nós na pessoa do pobre,
dos sem-direito, dos sem-terra, dos sem-comida, dos sem-casa, dos sem-saúde. Na
sua resposta final, Abraão é curto e grosso: "Se não escutarem Moisés e os
profetas, mesmo que alguém ressuscitar dos mortos, eles não se
convencerão!" Está encerrada a conversa! Fim da parábola!
* A chave para entender o
sentido da Bíblia é o pobre Lázaro, sentado à porta! Deus vem até nós na pessoa
do pobre, sentado à nossa porta, para nos ajudar a transpor o abismo
intransponível que os ricos criaram. Lázaro é também Jesus, o Messias pobre e
servidor, que não foi aceito, mas cuja morte mudou radicalmente todas as
coisas. É à luz da morte do pobre que tudo se modifica. O lugar de tormento é a
situação da pessoa sem Deus. Por mais que o rico pense ter religião e fé, não
há jeito de ele estar com Deus, enquanto não abrir a porta para o pobre, como
fez Zaqueu (Lc 19,1-10).
4) Para um confronto pessoal
1. Qual o tratamento que nós damos aos pobres? Eles têm nome para nós?
Nas atitudes que tomo na vida, sou parecido com Lázaro ou com o rico?
2. Entrando em contato conosco, os pobres percebem algo diferente?
Percebem uma Boa Notícia? E eu, para que lado tende o meu coração: para o milagre
ou para a Palavra de Deus?
5) Oração final
Feliz quem não segue o conselho dos
maus,
não anda pelo caminho dos pecadores
nem toma parte nas reuniões dos
zombadores,
mas na lei do SENHOR encontra sua alegria
e nela medita dia e noite. (Sl 1, 1-2).
Muito bom Dom Wilmar,o pobre sentado na porta precisa ser nossa chave de leitura. Se não for assim nossa reflexão será sempre vazia.
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